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Sobre o término saudável de relacionamentos

Não deu certo? Deu certo enquanto durou.

Ade Monteiro
3 min readOct 22, 2019

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Casais estão se separando e estão conseguindo não se odiar. Estão conseguindo terminar um relacionamento sem se destruir mutuamente e conseguem seguir em frente, livres, talvez mais leves, sem o peso da mágoa e do ressentimento. Isso quer dizer que resolveram todas as diferenças e serão amigos, felizes para sempre? Provavelmente não.

Pra mim, isso que dizer algo simples: estão conseguindo se comunicar.

Em absolutamente qualquer tipo de relacionamento, amoroso, afetivo ou não, a principal regra é a comunicação.

A comunicação é essencial para a saúde dos relacionamentos, mas não é suficiente. Precisamos desconstruir muita coisa, principalmente nas relações afetivas. Primeiramente a noção de posse de um outro ser humano. Objetos podem ser possuídos. Seres humanos não. Em nossa cultura patriarcal, nascemos e crescemos dentro dessa lógica possessiva que naturaliza a objetificação das pessoas. Nada, nem ninguém nos pertence.

Ainda sinto que é muito difícil para todos nós, dentro dessa cultura, compreender completamente isso. Por mais óbvio que pareça.

Eu sou livre, o outro é livre.

Mas também sinto que estamos evoluindo. Que as pessoas estão “desapegando”. Estão percebendo que o outro, “apesar de ter sido meu por um tempo”, agora pode caminhar sozinho ou com outra pessoa… pode dar andamento à sua vida e seus planos.

Não deu certo? Tudo bem! Você não precisa odiar a pessoa eternamente porque ela não cumpriu suas expectativas. Ou porque ela não se encaixou no modelo idealizado que você havia construído para ela. Ou porque ela foi egoísta, te traiu, foi desleal, não se comprometeu, não estava lá quando você precisou, não cuidou de você, te decepcionou profundamente! Isso tudo faz parte do processo. Isso tudo faz parte do amor, do amadurecimento. Se fossem somente rosas e pessoas encantadoras e perfeitas não existiriam tantas músicas, livros, filmes, peças de teatro e poemas maravilhosos. Nessa música por exemplo, Marisa Monte expressou perfeitamente um término saudável, ela fala tanto das mágoas quanto dos bons momentos que ficaram na sua memória.

Coração partido? Deita no sofá e dissolve as mágoas com essa música maravilhosa ❤

Esse é o drama da vida: nossas relações. E com elas, toda a dor e a delícia de vivê-las. Não é possível comprar o pacote pela metade. Não é possível escolher somente a parte boa, a parte que nos convém. O pacote vem com uma pessoa real — que também tem suas limitações, seus traumas, neuras, complexos, carências, tristezas etc. — e não a pessoa que você idealizou na sua mente.

As pessoas te questionam: "Não deu certo?" E você poderia responder: “Deu certo sim, por um tempo, pelo tempo que durou” (assim como disse Vinícius de Moraes: “que seja eterno enquanto dure”).

Não seria muito mais produtivo para sua saúde mental ter gratidão à esse ex parceire por tudo que viveram juntos, pelas coisas boas e ruins?

As coisas ruins é certo que te machucaram profundamente, mas te fizeram uma pessoa mais forte, foram aprendizado, crescimento. Hoje você acredita que é uma pessoa melhor? Você não seria se não tivesse tido essas experiências difíceis e tristes.

Porque não conseguimos desvincular os momentos felizes da pessoa que nos fez sofrer? A pessoa que está nas lembranças felizes era uma pessoa que — naquele momento — te fazia feliz. Mas com os traumas que vivemos, tendemos a esquecer as coisas boas dos relacionamentos. O rancor não nos permite. A mágoa não nos deixa ver o quanto foi bom no início, ou por um tempo. O ressentimento não nos deixa valorizar a felicidade que vivemos. Então só nos sobram mágoas. E ódio pelo outro. O outro que dividiu amor, planos, expectativas, esperança, que divide filhos conosco. O outro não é perfeito, assim como eu. O outro cometeu erros terríveis. Eu nunca?

Não se apegue às suas mágoas. Deixe o outro ir livre, para viver e aprender suas lições.

Exercite a empatia e o perdão não como ferramentas de submissão, mas de libertação.

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Ade Monteiro

Psicóloga, Doula e Terapeuta de Casais. Mestre em Estudos sobre a Igualdade. Mãe e feminista.